o papa "comunista"
Ódio nas redes: orações de "cristãos" pediram a morte do papa Francisco
Durante a internação do pontífice, mensagens de ódio e falsas orações proliferaram na internet
O papa Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, morreu nesta segunda-feira, 21, aos 88 anos. A informação foi confirmada oficialmente pelo Vaticano, que não divulgou a causa da morte. “Queridos irmãos e irmãs, com profunda tristeza devo anunciar a morte de nosso Santo Padre Francisco. Às 7h35 desta manhã, o Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e de Sua Igreja", diz o comunicado.
Francisco se recuperava de um grave quadro respiratório que o manteve internado por 37 dias no hospital Gemelli, em Roma, entre fevereiro e março. No domingo de Páscoa, ele fez sua última aparição pública ao abençoar milhares de fiéis reunidos na Praça de São Pedro.
Primeiro papa latino-americano da história, Francisco assumiu o papado em 2013 com uma missão clara: aproximar a Igreja dos pobres e marginalizados, reformar estruturas internas e combater escândalos. Seu pontificado foi marcado por gestos de simplicidade, discursos contundentes sobre desigualdade e uma postura acolhedora diante das minorias.
Mas o mesmo líder religioso que pregava o amor ao próximo se tornou, paradoxalmente, alvo de discursos de ódio. Desde que sua saúde se agravou no final do ano passado, mensagens torcendo por sua morte se multiplicaram nas redes sociais — muitas delas escritas por pessoas que se identificam como cristãs.
Trechos de postagens viralizadas são chocantes: “Papa comunista tem que morrer”, “todo sofrimento do mundo é pouco para essa desgraça”, “vou festejar o dia em que esse papa for para o inferno”.
Francisco foi acusado, reiteradas vezes, de ser “comunista”. Questionado sobre o rótulo em uma entrevista ao canal argentino C5N, ele respondeu com o Evangelho: “Minha carta de identidade é Mateus 25. Tive fome e me deste de comer, tive sede e me deste de beber, estive nu e me vestiste. Essa é a regra de conduta”.
A frase remete à célebre citação de dom Hélder Câmara: “Se falo dos famintos, todos me chamam de cristão, mas se falo das causas da fome, me chamam de comunista”.
Francisco também despertou fúria da extrema direita brasileira quando declarou que a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva havia sido injusta. Desde então, passou a ser incluído na lista de instituições e personalidades acusadas de “comunismo” por setores radicais: STF, Polícia Federal, ONU, artistas, jornalistas e até empresas como a Pfizer.
A banalização do termo serve hoje como código de identificação em comunidades digitais polarizadas. “Comunista” passou a ser um rótulo genérico usado para deslegitimar, desumanizar e incitar linchamentos virtuais, independentemente do real significado histórico, político ou filosófico da palavra.
Entre seus críticos mais ferozes, Francisco é condenado não por suas posições políticas, mas por sua postura pastoral. Defensor da doutrina da Igreja quanto ao aborto e à eutanásia, o papa foi chamado de “subversivo” por abrir espaço para o debate sobre a acolhida de homossexuais, migrantes e divorciados. Sua mensagem de solidariedade e justiça social foi muitas vezes confundida com militância ideológica.